quinta-feira, 18 de julho de 2024

Liberdade é mesmo uma boa coisa?

Ouvi a história de um monge Budista que vivia entre a China e o Tibet e certa vez, ele se despediu de seus discípulos, pois ia fazer um retiro solitário nas montanhas. Quando os monges budistas resolvem fazer retiros solitários, eles não sabem quando e se voltarão, pode durar meses, anos, décadas, ninguém sabe. 

Então, ele se despediu e foi. E alguns discípulos se dispuseram a levar alimentos de vez em quando, até o local onde ele ficaria. Ocorre que bem no período em que ele estava na montanha, eclodiu um conflito e ele foi pego pelo país vizinho e colocado injustamente em uma prisão. 

O monge não falava a língua dos vizinhos, então nem mesmo conseguiu explicar que estava por ali por motivos espirituais e permaneceu preso, sumariamente. Os discípulos que ficaram de levar alimento, não o encontraram mais e pensaram que o monge havia sido morto no conflito. 

Passaram-se três anos, em que o monge esteve preso em uma pequena cela, simples, solitário. Os guardas levavam alimento a ele e o monge seguia sua rotina diária: fazer suas orações, comer, dormir, sentar-se para meditar por horas a fio. Até que um dia, o conflito cessou e mandaram soltar o monge. Só que quando abriram a cela, o monge lá permaneceu, meditando. 

Os guardas estranharam. Achavam que como não falava sua língua, o monge não estava entendendo que estava livre. Pegaram o monge e o levaram para fora. O monge agradeceu e retornou a sua cela. Várias vezes, os guardas o conduziram para fora, mas o monge retornava todas as vezes para sua cela. 

Até que os guardas perceberam que o monge apenas queria continuar seu retiro. 

Ocorre que para o monge, ter sido preso injustamente, recolhido a uma pequena cela, alimentado todos os dias de forma simples, com um teto e um lugar para dormir era um grande benefício para seu retiro. Ele se sentia abençoado por terem-no acolhido ali. Não precisava se preocupar com trivialidades como conseguir alimento e cuidar de seu teto. A prisão era o lugar mais perfeito do mundo para fazer seu retiro. 

Para o monge a privação da liberdade era sua própria libertação mental. 

Compreendendo isso, os guardas deixaram que ele permanecesse ali por mais dois anos, até que o monge deu seu retiro por concluído e se despediu, retornando a seu mosteiro e seus discípulos. 


Esta história é verídica. E eu gosto de me lembrar dela quando falamos em liberdade porque o que sabemos da liberdade é uma ilusão que nos leva a decisões estúpidas, cagadas homéricas e preguiça histórica que nos deixa imóveis na merda quentinha e confortável que cultivamos com tanto apego e chamamos de liberdade. 

Liberdade para a maioria das pessoas é comer e beber sem limites, assistir porcaria na TV, não ter horário para nada, nem obrigações, ter muito dinheiro e poder para tomar suas decisões sem depender de ninguém. A grande ilusão é que tudo isso só nos leva a sermos mais preguiçosos, ignorantes, gordos, inúteis e dependentes de dinheiro, poder, lazer e diversão. É uma dependência inconsciente, pois as pessoas vão dizer que são livres perseguindo essas coisas. Se não as têm, são livre para perseguir esses "sonhos", ou seus "sonhos de consumo". 

Mas dependência não é liberdade

Não estou dizendo que você pode ser livre se andar por aí nu com a mão no bolso. Não é isso. Tenha seus bens, compre coisas, tudo bem. Mas esteja sempre alerta para o que significa isso. Estou comprando isso porque é necessário, ou porque preenche uma carência afetiva minha? Estou comemorando a sexta por quê? Odeio meu trabalho e o tédio me faz encher a cara o fim de semana todo pela ilusão de liberdade? Meus sonhos são plantados pela ilusão de liberdade? 

No fim das contas, a liberdade inventada pela sociedade de consumo só deixa as pessoas mais infelizes e presas, dependentes de padrões forçados, incutidos em suas mentes para não questionarem e continuarem produzindo, consumindo, perseguindo sua pseudo felicidade nisso. 

Tá e como fico livre se não é assim e não é nu com a mão no bolso? 

É libertando sua mente destes padrões, pequeno Padawan! Não apenas questionando intelectualmente, mas praticando o desapego a essas ideias fracassadas de liberdade e felicidade. É tomando consciência da sua prisão dourada, invisível, porém presente, a cada dia, a cada data de vencimento do cartão de crédito. 

É tirando todo o trivial e vivendo apenas a essência da vida, aquilo que ninguém pode te dar, te vender, te mostrar. Mas só você pode encontrar, se for menos seguidor de tendências e mais consciente de suas escolhas. 

Tente! É horrível nadar contra a maré de zumbis iludidos. Mas é libertador. 

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