terça-feira, 28 de maio de 2024

Sobre o gozar e a dificuldade de se adaptar ao envelhecimento

 Sabe qual é o pior tipo de velho? É aquele que quando era novo tirava sarro dos mais velhos. Porque ele cresceu achando a velhice ruim. Cresceu achando que seria eternamente jovem e nunca mudaria. 

Mas, fato da vida é que ninguém neste mundo está ficando mais novo. E o adolescente que hoje tira sarro dos idosos, um dia será idoso também. A menos que morra, aí, pelo menos, vai ser um velho ranzinza a menos no mundo. 

O passar do tempo é de uma inevitabilidade marcante. Mas então por que nos apegamos à uma imagem tão breve quanto é a da juventude? Será que o ser humano é tão ignóbil assim a ponto de tentar parar o tempo? 

Tempo é como água, você pode tentar segurar nas mãos, mas não vai conseguir. Vai fenecer no processo. E quanto mais tentar, quanto mais se esforçar, pior vai ser seu fenecimento. Será um velho do pior tipo. Aquele que range os dentes porque os joelhos rangem. Que acha que é o único a sentir dores articulares e o peso da idade. Que anseia por um implante capilar, um novo tratamento antirrugas, um modo de deixar a próstata enxuta, hormônios para não perder testosterona, para superar a menopausa. 

O decaimento do corpo é sutil, mas nem sempre suave. É um encontrar-se branco onde era preto. Enrugado onde era liso. Frágil onde era forte. O broxável no imbroxável. 

E o gozo que antes era constante, saudável, jorrava e espirrava, agora é raro. E se não for é apenas falso. Pílula azul. 

O pior velho é aquele que queria, mas não goza. 

Porque aprendeu o gozar apenas no predomínio fálico e não transferiu o gozar para a vida inquietante e mágica. Porque em vez de apreciar, conviver, amar e se deslumbrar com o novo, dia após dia, reclamou, odiou o mais velhos e quando envelheceu, odiou por inveja os mais novos. Perdeu a chance de se surpreender com o belo no simples, com a nobreza na atitude serena e compassiva do aceitar que o tempo passa. 

E que o gozar muda de objeto. Se o objeto óbvio do gozo jovem era o sexo. Na velhice, o gozo é atitude, é a sabedoria, a nitidez que a experiência acrescenta sobre a vida. O simples entender que a ansiedade de estar sempre certo e querer resultados rápidos morre muito rápido. 

Na medida em que o gozo muda de objeto, entendemos que o prazer da vida é o simples viver. Encantar-se pela surpresa diária de se ser quem é, sem esperar ser o mesmo. Que estar sempre certo é um grande erro. E que resultados rápidos tiram o prazer da jornada do aprender. 

E que ninguém nem liga para você tanto quanto você gostaria. Você acha que todos te olham e te vigiam. Que comentam sobre você e te acham incrível ou detestável. E mostram comentários do Instagram para provar que sim, as pessoas se importam. Bem, a realidade é que se você excluir seu perfil, ninguém vai vir na sua porta perguntar o motivo. 

Ninguém se importa contigo por um tempo maior que um rápido clique. E se você acha isso cruel é porque nunca foi livre de verdade. Porque liberdade é agir como se ninguém se importasse. Ser o que se é, sem prestar contas, nem criar ou ter expectativas. 

Liberdade é gozar ao infinito, a vida inquietante, mágica e impermanente. 

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